Sunday, June 18, 2006

OUT DO ORKUT

O nome "Orkut" pra mim remetia a nave russa, fria, orbitando no ciberespaço. Até que sábado passado resolvi me embrenhar, timidamente, por esse cipoal de relacionamentos. E vi que de frio o orkut não tem nada. O orkut é quente. O orkut pega fogo.

Entrei com o login da minha filha, pois ninguém me convidou pra ser um orkutiano (nem ela!). Claro, o que um tiozinho – no caso, um paizinho - vai estar fazendo por lá?

Comecei a procurar amigos de infância e de adolescência, hoje todos na casa dos 40. E percebi que eles estão no orkut, sim, mas como eu: não como membros. Os membros são seus filhos, e meus amigos aparecem como pano de fundo em fotos de festas de aniversário, férias, formaturas. Isso quando aparecem, já que muitas vezes são eles quem batem as fotos...

Evidente que o orkut não é um lugar só de teens. Meu tio Jairo tem quase 80 e está lá. Se há alguém que dá bola pra ele, já é uma outra história. Mas jogou sua garrafinha naquele mar, como que dizendo "não estou por fora disso, não".

Na São João do Tio Jairo, todo o cosmo cabia na pracinha da cidade. O orkut da época conectava gente em carne e osso, com hora marcada para os encontros: domingo, depois da missa. O on line era tête-à-tête, olhando nos olhos, sentindo o perfume e o hálito, sussurrando ao ouvido.

Tudo muito mais humano, mas também mais limitado. O sujeito crescia com aquela meia duzia de amigos e depois do "colegial" ia pra cidade grande fazer faculdade. Voltava uns anos depois pra terrinha, decidido a montar clínica, comércio ou escritório. Pra mais tarde casar, procriar e trabalhar com afinco para dar o melhor aos seus meninos.

Com o orkut, as possibilidades de conhecer novas pessoas se multiplicam em progressão geométrica, ainda que essas pessoas se façam ciberpresentes maquiadas pelo photoshop e se definam invariavelmente como inteligentes, bonitas, carinhosas, compreensivas e extrovertidas.

Mesmo que não busque exatamente informação, um jovem no orkut é um ser antenado, sabe o que se passa à sua volta. Diferente de mim, que só vim a saber que havia uma ditadura em curso aos 19 anos, na Universidade (nasci em 64, uma semana antes da "gloriosa"). Como ninguém falava abertamente nisso, o anti-estado de direito parecia, aos mais jovens, a ordem natural das coisas. Sou da geração Coca-Cola, a perdida, sem bandeira ou ideologia. Filho dos anos de chumbo, usava crachazinho verde e amarelo na Semana da Pátria. Os militares eram presidentes porque os presidentes eram naturalmente militares. E pronto.

Sorte dos novos, que com o orkut e outros bichos estão a salvo dos embustes que eu e meus amigos quarentões tivemos de engolir.

Viva o orkut. Ainda que viver seja estar no mundo em forma de pixels e bites.