Eram três e vinte. A consulta estava marcada para as quatro, e acho que pela primeira vez na vida comecei a reparar nos detalhes peculiares de uma sala de espera. Percebi que havia pouquíssimas diferenças entre aquela e todas as outras que já tinha entrado. Só variavam o endereço e a especialidade do médico ou do dentista.
Você chega e, antes de sentar-se, vai direto ao porta-revistas. Que nunca é um porta-revistas. Ou é um tacho de cobre ou uma cestinha de vime. Dentro, algumas "Veja" sem capa, publicações médicas, tablóides de ofertas do supermercado mais próximo e livrinhos de palavras cruzadas já resolvidas. Se for consultório de pediatra, costuma ter gibi também. E, claro, uma revista Nova bem velha. De 98, 99, por aí. Com uma mulher maravilhosa na capa, em superclose, enrugada como um maracujá de gaveta pelo amassado do papel. Iguais as que a gente encontra no cabeleireiro, mas sem as mechas de cabelo anônimo no meio. Fuçando mais um bocadinho você vai encontrar umas duas ou três Caras que já viraram Coroas, esfarelando e mais amareladas que os manuscritos do Mar Morto.
Geralmente, a revista que você pega é um pouco mais interessante que a do sujeito que está ao seu lado. É quando você percebe que são dois lendo a mesma matéria. O cara com o pescoço cada vez mais esticado para o seu colo. E você fica naquela, sem saber se vira ou não a página, se o vizinho já terminou ou não a leitura dele.
Não demora e chega o puxa-prosa. Aquele que diz “como vai?” e, antes que você responda, já vai logo contando como ele vai. Começa falando do tempo e em questão de segundos desembucha a ficha completa: de onde é, onde dói, a filha casada que mora em Mato Grosso, o filho metido com droga, o terreninho que ele comprou em Boiçucanga com a herança deixada por um tio-avô.
Algumas salas de espera têm aquário, com acarás-bandeira, peixes japoneses, paulistinhas e até cascudos. Sem som ambiente, fica só aquele glub-glub da bomba de ar, que é tiro e queda como sonífero. Quando estiver numa dessas, pode reparar: de cada dez, tem uns quatro dormindo. E ferrados no sono, com fio de baba escorrendo e tudo.
Existem tipos invariavelmente encontráveis em toda sala de espera que se preze: a mãe com um pestinha que não pára quieto (o pentelho quase sempre é acompanhante e não o paciente, pois demonstra uma saúde de ferro). O homem que fica olhando para a ponta do sapato, com o pensamento a léguas dali. O propagandista de laboratório, tamborilando com os dedos em sua pasta preta e consultando o relógio a cada dois minutos. Uma perua falando alto ao celular. A patricinha com seu "Diário de Bridget Jones", mascando chiclete e de calça Diesel.
A intimidade que você acaba tendo com a sala de espera é praticamente compulsória, pelo tempo a mais que você tem que ficar esperando. A consulta das 13h30 é, na verdade, às 14h45. O problema é que, se você não chega às 13h30, o paciente das 14h, que só vai ser atendido às 15h15, passa na sua frente. Ou seja, você está condenado a ficar ali contando não sei quantas vezes os ladrilhos do chão.
Uma voz feminina, com inflexão de locutora de aeroporto, me tira do devaneio:
- Sr. Marcelo... Sguas...
E enrosca no Sguassábia. Lógico.
- Primeira porta à direita. É retorno, senhor?
- Não. Mas é como se fosse.
- Ahn??