Pasta o verde da fazenda no amendoal dos teus olhos. Lavoro onírico, delírio que toma corpo e afronta o cansaço-cão. O trem da Mogiana vem chegando e descarrila ao topar com teus desvios. Bifurcadora de sinas, segues gestando tornados. O sol a pedir licença pra se pôr em tua figura. Não há átomo no cosmo que, ao pressentir tua passagem, não fique tomado de espanto e seja teu servo devoto.
Corações mirins aos pulos, arranhões nos cotovelos. Tábuas toscas que aprisionam os bezerros nos currais. Os olhares que na infância um ao outro nos lançamos, vejo agora com clareza, é a lã da ovelha polindo palmo a palmo esses alqueires.
Pois então me diga o que fazer com todo esse barro preso nas botas, as farpas todas desses mil arames, as carpas todas no azulado lago? E quanto aos vultos que se escondem nas mangueiras do pomar, assombrações que criamos nos idos de era uma vez?
O pensamento submerso no sereno reticente, bambeio as pernas, ferido. Ancinho gasto de recolher os escombros dos umbrais. É certo que em algum lugar a primavera aflora solta e desavergonhada. Talvez nós dois numa estação de águas, lívidos de cera e ávidos de ser no meio daquilo tudo que nos aconteceria.
Evoca, da tua parte, esse tempo de contornos indecisos, sem termo e grávido da gente. Guarda no recato do decote a lembrança do viver que não tivemos. Essa foto aqui no colo é reles bi-dimensão no véu da tarde esquecível. Não, não quero nunca o remorso pelo nada que ouviste, no que faltou te dizer. Ainda mais a essa altura, reféns amorfos que somos de um passado que não passa. Aguça o senso do sentir, e basta.
Persevero na imperícia, desembestado em mazelas, sem freios de praga em praga. Montado nesse alazão que a nada vai me levar, além dos parcos domínios de me saber e de te adivinhar. Resiste o nó de você no areião dos exílios. Que carícia na penugem das espáduas, cá dentro o vento te esculpe no mole mármore das nuvens. Marisas aos montes entram pelos tímpanos e reverberam nas entranhas. Eis agora a mesa posta com os frutos dessas paragens, que nascem e jazem escondidos nos cantos da tua boca. Deita-te sobre a música, deixa-te sonhar também.
Essa linha em branco aí em cima é a que falta ser escrita no evangelho de nós dois. Atira a primeira sílaba, espero que seja "sim", começa que eu acompanho.